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Clarita Mascarada

Clarita Mascarada

Na Páscoa de 2010, fiz uma viagem a Portugal com o objetivo de encontrar o amor no “meio do caminho” entre a Espanha e o Brasil. Encontrei amor e mais, encontrei Clarita.

Durante uma caminhada sem pressa, dessas que a gente só faz em viagens, cruzei com ela pela primeira vez em uma feira de antiguidades de Vila Nova de Gaia. Quem me conhece sabe o quanto eu fico entusiasmada com possibilidade de levar pra casa fotos de familias que não são a minha. Honrando o padrão de maluquice dos Colecionadores de Retratos Anônimos, comecei a procurar rostos conhecidos em uma caixa de fotos cheia de imagens de um passado que não era meu. E lá estava ela…

Quando encontrei a primeira foto, já não pude mais deixar de olhar praquela moça, ingênua porém atenta, muito bem vestida, muito bem penteada. Parecia estar de férias, mas nem um fio de cabelo fora do lugar. Sorriso de Monalisa, com covinhas discretas, toda uma diva. De repente, outra foto! E era a mesma pessoa! Surgiram várias imagens, de diferentes lugares e épocas. Mas sempre o mesmo olhar, um  encanto natural. Resolvi perguntar pro dono da banca: quem é essa senhora? Como ela veio parar aqui, nessa caixa? Ora pois, o que segue é história:

Resulta que Clarita era conhecida do pessoal, como sempre acontece nas cidades pequenas. Foi casada com Carlitos durante toda sua vida e se amavam serena e profundamente. Tiveram filhos, netos, uma casa no campo. Até que um dia Clarita adoeceu e para o inconsolável pesar de Carlos, não voltou do hospital. Ele decidiu que também não voltaria, não colocaria os pés novamente naquela casa que era deles, que era ela. Tudo ficou onde estava. Nas palavras do amigo antiquário: “o açúcar ficou lá aberto em cima da mesa, como deixou quando saiu para visitá-la aquela manhã”. Desde aquele dia, ele passou a viver na casa de campo, de onde saiu apenas para cumprir seu fado. 

Mas como as fotos chegaram àquela caixa? Prefiro não julgar, meu próprio relacionamento com as imagens é um caso terapêutico. A casa ficou fechada até que um dia tudo que estava dentro, assim como seus donos, teve o seu destino. E Clarita veio pra mim, é isso que importa. 

As fotos eram sempre dedicadas, com muito apreço, muita doçura. “A meu grande amor e querido Carlitos da sua sempre apaixonada Clarita”, “Em todos os meus passeios eu penso em ti meu bem amado. Tua fiel, Clarita”, “Clarita que o amará sempre”. Na despedida, o senhor me cobrou pelas fotos muito menos do que eu julgava que elas valiam. Parecia que o fato de agora dividirmos aquela história e que eu a levasse pra viajar por novos horizontes lhe deixou secretamente satisfeito. Como um atestado não verbal de que tudo aquilo era verdade, me fisgou quase partindo com uma última surpresa: “Leve também este cartão de visita dos dois, não vou lhe cobrar, este eu lhe ofereço”. Era o que faltava, eu agora tinha o endereço… mas isso já é outra história. 

Clarita vai bem, obrigada. Depois de alguns invernos madrilenhos, está passando uma temporada no Rio de Janeiro, onde inspirada pelo Carnaval e pelas manifestações anti-corrupção, adotou a máscara ao seu visual. Clarita sempre sabe o que dizer com leveza e suavidade, tem um bom conselho para cada situação, todos gostam muito dela por aqui. Temos agora uma relação de profundo afeto e gratidão: ela, pelo fato de tê-la resgatado daquela caixa e trazido além mar; eu, por ela ter me ensinado que o amor pode sim ser eterno, como eu suspeitava. Sem mais, Clarita Mascarada

Técnica: Impressão Laser Digital  e Carimbo Artesanal

Dimensões: 42 cm x 29,7 cm

Tiragem : Ilimitada 

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